sexta-feira, 20 de março de 2009

Entrevista da Beira TV ao blogue Webtelevisão

Esta foi a entrevista concedida a 11 de Março pela Beira TV ao Nuno Fernandes, responsável pelo blogue Webtelevisão, a propósito de mais uma emissão em directo:

NUNO FERNANDES: No dia 16 de Fevereiro, a Beira TV transmitiu ao longo do dia, em directo, o Fórum ESART. Qual é balanço?BEIRA TV: Foi uma experiência bastante interessante. Nos últimos meses têm sido feitas transmissões em directo noutras web tv’s. Deixou de ser um desafio técnico, mas não é ainda prática comum. Por isso mesmo, qualquer iniciativa que entretanto venha a ser feita merecerá destaque na história da televisão local e regional em Portugal. A emissão em directo das intervenções mais relevantes do Fórum ESART 2009 permitiu testar novas abordagens e perceber em que áreas a Beira TV, mais do que um suporte de divulgação complementar aos restantes media de proximidade, se pode constituir, por exemplo, como uma ferramenta de apoio ao ensino. Esta é uma utopia que a televisão tradicional tem vindo a desfazer, mas ao contrário da sua parente mais velha, de estrutura pesada e condicionada aos formatos já testados, uma pequena webtv tem versatilidade suficiente para testar soluções que lhe permitam produzir conteúdos diversos, utilizando um mínimo de recursos técnicos e humanos. Fazendo uso da apologia anti-crise, é aqui que as dificuldades com que um projecto destes se confronta diariamente se podem transformar em oportunidades. Neste caso concreto, bastam dois técnicos com uma câmara, um computador portátil e um ligação à Internet para combinar intervenções em directo com conteúdos gravados, obtendo-se um produto profissional, ainda que sem qualidade broadcast, mas à altura do que fazem as grandes estações generalistas. Tudo o que se requer é algum planeamento, metodologia e capacidade inventiva, caso contrário o directo não passará de uma intervenção pontual e inócua que rapidamente é esquecida. A fórmula só funciona porque as emissões são editadas e mais tarde é disponibilizado um compacto no portal da Beira TV.

Como surgiu a ideia de transmitir em directo o fórum?
Esta já não foi a estreia da Beira TV nas transmissões em directo. Acontece é que cada nova emissão ao vivo permite aperfeiçoar o que foi feito anteriormente e descobrir formas adicionais de rentabilizar os conteúdos do canal, mais uma vez na Internet. Esta plataforma universal não pára de fornecer novas ferramentas - dos blogues e redes socias às mensagens instantâneas ou agregadores de vídeos – que personalizamos e vamos cruzando conforme as necessidades. Nessa lógica, o streaming de video, com um custo marginal em relação aos gastos operacionais da Beira TV, é uma porta aberta para uma infinidade de utilizações. Feito todo o investimento na estrutura tecnológica do canal, há apenas que salvaguardar o tráfego de dados entre o local e o servidor da Beira TV, o que pode ser feito numa ligação já existente ou através de um acesso de banda larga sem fios. Foi por o Corpo Nacional de Escutas nos ter desafiado a dar esse uso a esta plataforma que em Outubro de 2008 fomos a televisão oficial do jamboree mundial escuta em Portugal, o que nos permitiu realizar uma emissão experimental de três dias a partir do agrupamento de escuteiros em Belmonte, transposta em simultâneo para os portais do CNE e da Beira TV. Foi uma aventura gratificante, ainda que algo atribulada, mas deu a entender que o streaming de vídeo em directo, serviço que vários portais já fornecem gratuitamente aos internautas, era uma área a explorar a curto prazo. A estreia efectiva da Beira TV nas coberturas em tempo real deu-se em Novembro no Museu da Música, em Lisboa, de onde transmitimos um recital do Avondano Ensemble, o que acabou por ter alguma repercussão junto de media nacionais como a RTP, Visão, Jornal de Notícias ou o portal de notícias do Sapo, já que foram utilizados instrumentos do século XVIII. A televisão tradicional continua a ter peso social, ainda que o audiovisual caminhe para a multiplataforma e a hipersegmentação. Tal como aconteceu com web tv’s como a Oeste TV, a TV Fátima ou a TV Tejo, que disponibilizam blocos de conteúdos aos canais promocionais dos operadores de cabo da sua zona, no futuro a Beira TV também poderá vir a fazê-lo de forma a crescer e a consolidar a sua presença na região. Outra alternativa é o estabelecimento de parcerias com os media locais, o que beneficiaria ambas as partes na economia de meios e na diversidade da produção informativa, ou a assinatura de protocolos com operadores de televisão de sinal aberto, tal como a SIC fez há uns anos com a Universidade da Beira Interior, na Covilhã. Contudo, qualquer decisão nesse sentido dependerá quer do interesse da instituição gestora e do proprietário do canal (Escola Superior de Artes Aplicadas e Instituto Politécnico de Castelo Branco, respectivamente), quer das propostas que venham a ser colocadas sobre a mesa.

Qual o número de ligações ao directo, ao longo do dia?
Dada a sobreposição de tarefas, durante o Fórum ESART não pude acompanhar as estatísticas em tempo real, mas creio que o número de visualizações em simultâneo seguiu a média das experiências anteriores. Em Belmonte, uma medição aleatória no final do segundo dia de trabalho revelou cerca de duas dezenas de ligações em simultâneo. No entanto, numa emissão de várias horas seguidas dificilmente a atenção dos internautas é linear, havendo que contar com possíveis quebras na ligação entre o local e o servidor ou entre este e os utilizadores finais. Também deverão ser tidos em conta condicionantes como os horários da transmissão e a especificidade da temática, o que pode constranger ou reforçar o interesse potencial do público. Quem está fora da região dificilmente terá forma mais completa, instantânea e inovadora de acompanhar o que está a acontecer em determinado sítio, o que implica desde logo a divulgação antecipada do evento nos suportes que temos ao nosso alcance. A acreditar nas estatísticas gerais do sítio da Beira TV, é provável que durante algum tempo a maior fatia de espectadores se continue a concentrar em Lisboa, o que por si só já revela um padrão curioso, mas Castelo Branco e Covilhã ganham terreno à medida que a Internet reforça a presença no interior e o projecto se vai dando a conhecer melhor aos residentes na região.

Quais foram as principais dificuldades do directo?
Como tudo estava controlado, praticamente só foi preciso garantir que não haviam falhas na emissão e, a haverem, que eram rapidamente corrigidas, visto que se utilizou uma ligação sem fios de forma a facilitar a mobilidade do equipamento entre os auditórios, separados por um par de quilómetros. Apesar das limitações em termos de largura de banda, a solução técnica foi suficiente tendo em conta as configurações dos sinais de áudio e video, ajustados para uma qualidade média que à partida não comprometia a transmissão, o número de acessos e a ligação dos internautas ao servidor. Durante a manhã não se registaram problemas de maior. Já à tarde, uma quebra na rede impediu a transmissão total das palestras, que até estavam a ter algum feedback no Twitter. Quanto ao alinhamento, a principal preocupação foi a de preencher momentos mortos como mudanças no painel de conferencistas, intervalos ou interrupções inesperadas com vídeos promocionais, separadores e entrevistas a alguns dos oradores. Inovadoras foram as flash interviews, disponibilizadas horas depois no canal no YouTube na versão streaming, tal como foram emitidas, enquanto que os restantes conteúdos pré-gravados seriam mais tarde colocados no sítio da Beira TV, aqui com menos compressão e maior qualidade de imagem.

Podemos esperar novos directos por parte da Beira TV?
Sim, numa primeira fase a cada dois ou três meses, já que será preciso encontrar um equilíbrio na tipologia de conteúdos. Enquanto se mantiverem a estrutura actual e a limitação de recursos, o que impede que se emita em directo com maior regularidade, a prioridade continuará a ser o video on demand, produzido sempre que possível de forma criativa e complementando a informação com outro género de conteúdos. É esse o ponto forte e diferenciador da Beira TV. Não havendo para já grande vantagem competitiva nas hard-news, resta apostar em produtos mais trabalhados e de maior profundidade. Há que rentabilizar ao máximo os meios disponíveis e manter uma abordagem funcional se não quisermos que o projecto fique pelo caminho. A Beira TV continuará a ser um laboratório televisivo, mas, como media inserido na comunidade, exigem-se-lhe capacidade crítica, frontalidade e abertura perante a evolução da área e do mercado, compromissos de resto assumidos publicamente no lançamento do canal. Quanto aos directos, esta é uma forma diferenciada e mais extensiva de divulgar eventos, prioritariamente de interesse público, como colóquios, conferências, espectáculos ou certames, bem como outros que à partida estejam afastados da agenda política ou tenham pouca cobertura mediática. Quanto às próximas emissões, para já apenas posso adiantar a transmissão do Fitas 2009, a partir do Cine-Teatro Avenida, em Castelo Branco, entre 8 e 10 de Maio. É uma forma de associar a Beira TV a uma iniciativa de peso junto da comunidade académica, quem sabe com algumas novidades pelo meio. De resto, ficamos abertos a sugestões, desde que enquadradas no perfil e objectivos do canal.

Uma das novidades que este directo trouxe foi os bastidores de toda a emissão via Twitter, qual foi o acompanhamento?
O acompanhamento em tempo real no Twitter, mais rápido do que aquele que é feito pelas agências de notícias, ajusta-se na perfeição à cobertura de eventos em directo e à estrutura de uma webtv, conferindo-lhe uma imediatez que a televisão tradicional não tem. No caso do Fórum ESART 2009, o Twitter permitiu fornecer no momento informações diversas a quem não pudesse acompanhar a emissão ou sofresse quebras na ligação e mesmo assim quisesse ficar a par do que estava a acontecer em Castelo Branco. São dados que até era possível passar nos oráculos ou na locução em off, o que foi feito ao longo de todo o dia, mas desta forma estes ganharam autonomia em relação à própria transmissão. Esperemos que no próximo evento às dicas dos bastidores e aos avisos sobre a programação a colocar no ar se possam juntar outras informações. Fora disso, e mais do que uma fonte de notícias para a Beira TV, o Twitter é uma ferramenta de divulgação permanente do canal e de alguns dos seus conteúdos, permitindo-lhe chegar a públicos que à partida, dado o desfazamento geográfico ou temático, dificilmente iriam contactar com a estação. Espero que encontremos novas formas de o utilizar, nomeadamente combinando debate em antena com intervenção dos ouvintes via Twitter.

Qual é o balanço até ao momento de todo o projecto da Beira TV? E o futuro, que perspectivas?
Numa área volátil como o multimédia, não é fácil arriscar projecções, mesmo a curto prazo. A Beira TV foi a primeira televisão online de âmbito regional na Beira Interior e um dos primeiros projectos em Portugal a recorrer em exclusivo à Internet como plataforma de emissão. O canal, criado em Janeiro de 2007, sucedeu à ZIP TV, a televisão interna do IPCB. Para já, limita-se aos recursos técnicos e humanos próprios da ESART, mas o seu crescimento e consequente autonomização, ambos desejáveis, dependerão sempre do exterior. De momento, sem a componente publicitária e sem um mercado audiovisual na região, resta o estabelecimento de parcerias com entidades próximas que trabalhem na área do multimédia. O projecto continua também aberto a instituições de ensino, entidades públicas ou empresas dos distritos de Castelo Branco e Guarda que pretendam divulgar conteúdos ou colaborar com o canal, e que de resto foram desafiadas desde o início a colaborarem com a Beira TV. São formas de aumentar a dinâmica e de partilhar os custos de um meio informativo com uma forte vertente educativa e cultural, e a única alternativa que temos enquanto as televisões locais e regionais não surgem, efectivamente, por cá nem chegam, em definitivo, ao hertziano ou ao cabo. Para já, disponibilizamos centena e meia de vídeos com um total de cerca de dezasseis horas, os quais obtêm uma média de duas mil visitas e cinco mil visualizações mensais. Somam-se os números do canal da Beira TV no YouTube, adaptado também à visualização em PDA ou telemóvel. São cifras que continuam a crescer e valores razoáveis se tivermos em conta a centena e meia de webtv’s existentes em Portugal e que a atenção dos espectadores se reparte por cada vez mais fornecedores de conteúdos de vídeo, desde os jornais e rádios às televisões nacionais. Mesmo assim, a Beira TV consegue destacar-se, já que muitos internautas e alguns media acabam por divulgar as nossas peças nos seus blogues ou sítios, como já aconteceu por iniciativa do jornal Expresso. Essa rede invisível de ligações que os utilizadores estabelecem pode ser a justificação para o aumento da visibilidade do canal. Falta agora melhorar e mesmo renovar algumas áreas, da parte gráfica à promocional, o que será feito assim que estejam reunidas as condições necessárias. Como trabalhamos com os recursos de uma escola, é natural que em primeiro lugar estes estejam afectos ao ensino, o que retira alguma agilidade ao projecto. Importante é que, apesar disso e a médio prazo, esta consiga trilhar um caminho próprio, combinando a linguagem da televisão e do multimédia com o carácter multidisciplinar da Internet. Mesmo que a publicidade se imponha mais tarde, há condições para que o canal continue a concentrar-se na produção de conteúdos alternativos aos dos media locais e regionais. Para já, mantém uma expressão discreta junto da opinião pública, mas é na Internet lusófona que se joga o futuro deste e de outras iniciativas similares entretanto criadas – desde os vídeos disponibilizados pelos jornais Diário XXI e Reconquista e pela revista A23 à versão web da Televisão Interna da Universidade da Beira Interior - ou que venham a surgir na zona, até porque nem só dentro de portas, onde o mercado é limitado, se encontra o público-alvo ou que pode vir a interessar à Beira TV.